Leituras
Inventário de Sonhos de Chimamanda Ngozi Adichie
NOTAS DA AUTORA
“Os romances nunca são, realmente, sobre aquilo que são. Pelo menos para esta autora. Inventário de Sonhos é, sim, sobre os desejos interligados de quatro mulheres. No entanto, de uma forma profundamente pessoal que não será óbvia para o leitor, pelo menos de modo imediato, é, na verdade, sobre a minha mãe. A perda da minha mãe. Um desgosto ainda obstinadamente incipiente, as supostas fases nem sequer começadas, mas perfeitamente irrelevantes, os seus contornos intactos e intocados – a confusão e a incredulidade, a miríade de arrependimentos.”
“Não poderia ter imaginado escrever a personagem de Kadiatou, que é inspirada em Nafissatou Diallo, quando em maio de 2011 ouvi falar nela pela primeira vez, uma imigrante guineense que limpava quartos num prestigiado hotel nova-iorquino. Ela era falada nas notícias porque acusara um hóspede do hotel – Dominique Strauss-Kahn, diretor do Fundo Monetário Internacional – de agressão sexual. Segui a história com atenção, até mesmo ardentemente. Tocava em muitos pontos-chave da vida americana moderna, poder e agressão sexual, género e imigração e raça.”
CAPÍTULO IV. OMELOGOR
“Eu viera para a América na esperança de encontrar uma parte de mim que fosse mais nobre e melhor; viera em busca de restabelecimento. Uma vez que queria tão desesperadamente elevar mais os olhos e ser recordada de coisas em que pudesse acreditar de novo, o desencantamento magoou-me. Desencantamento desiludido, ou desilusão desencantada, um sentimento com pederneira no âmago, como se uma tia querida a quem tivesse recorrido em busca de auxílio se tivesse virado e pregado na minha cara uma série de bofetadas surpreendentes. No meu prédio, havia uma sala de jogos e um terraço no telhado e um salão tranquilo para os residentes, que era aspirado duas vezes por dia. Entrei pelas portas de vidro e desejei que o meu interior combinasse com a claridade daquele salão. A infelicidade sempre me parecera uma emoção grande e dramática, mas sabia agora que era pequena e gotejava lentamente, uma submersão em águas rasas que parecia eterna.”
“Fiquei perplexa. Vista de fora, a América faz mais sentido. Querem que a nossa vida encaixe nas suas teorias débeis e mal alinhavadas, e quando isso não acontece, brandem a sua certeza provinciana.”



